“Me sinto um inventor”, diz o artista M0XC4 sobre a construção de suas obras

Por: Geórgia Ayrosa

“O excêntrico cientista Seth Brundle completa seu dispositivo de teletransporte e decide testar a eficácia do experimento em si próprio. Sem que ele perceba, uma mosca cai no aparelho durante o processo e provoca uma fusão dele com o inseto. Contudo, ele pensa que o experimento foi um sucesso, até que começa a notar que as células da mosca estão tomando conta de seu corpo, e ele acaba se transformando em uma criatura monstruosa.”

O filme “A Mosca” (1986), do diretor canadense David Cronenberg, apresenta confluências com a obra do artista visual baiano MOXC4. Enquanto o protagonista do filme se funde com um inseto, dando início a uma mutação genética, M0XC4 fala sobre a “obsessão pela etimologia (onde) posso modular a composição de um corpo completamente novo” e uma “superexposição de um esqueleto, e desses ossos refaço toda a anatomia.” Ou seja, a mutação de corpos está presente em ambas as obras. Não é à toa que M0XC4 cita Cronenberg como uma de suas maiores inspirações.

Confira abaixo a entrevista completa com o artista:

Pode fazer uma breve apresentação sua?

Sou artista do extremo-sul da Bahia, me movimentando no cenário da arte a pouco mais de seis anos, com exposições coletivas nacionais e internacionais. Na pintura, objeto e instalação reivindicou a liberdade de representação anatômica do meu corpo, emancipação do trabalho e des-maquinização.

“F1Z4L”, 2022. Mixed on canvas.

Como surgiu a sua relação com a arte?

Muita gente responde essa pergunta com um “desde criança”, não é diferente comigo. A infância sempre é fortemente sensorial para qualquer pessoa, mãos inquietas e energia incansável. Posso ver que minha trajetória nasce da demora nesse estado de curiosidade por materializar ideias, assim sempre estive envolvido com iniciativas de inserção cultural na minha cidade, apesar de cenário diversificado de história era também escassa de locais que representam a arte contemporânea, museus congelados e tímidas galerias, tudo sofre uma reviravolta à seriedade na minha primeira visita a Salvador em 2012, onde conheço a função de artista como uma possibilidade participando de um pequeno festival de arte no Teatro Vila Velha, me interesso prontamente pelo universo por me sentir já naquela época muito confortável com a ideia de produzir arte. Me mudo em 2015 para Salvador para estudar na Escola de Belas Artes.

De onde vem suas maiores inspirações?

Penso sempre como sou um produto de minha época: pela necessidade de pesquisar referências que contemplem meu corpo, mas também por estar enrolando nessa massiva produção de imaginário de século XXI, assim as inspirações vão de John Carpenter e David Cronenberg á Achille Mbembe. Sinto muita afinidade também com artistas que exploram a própria representação fora da norma em seus trabalhos, assim como dismorfia, analogia e que destroem símbolos hegemônicos.

“F4XAT”, 2022. Mixed on canvas.

Com quais materiais você mais gosta de trabalhar? Por que?

Gosto muito do desenho de caneta em papel, é um lugar nostálgico por hoje não ser tão recorrente. Me sinto confortável, é meu desenho de tempo livre.

Como você descreveria a estética do seu trabalho?

Me sinto um divisor, nessa obsessão pela etimologia posso modular a composição de um corpo completamente novo, e nesse pequeno ‘poder’ de divisor vejo as silhuetas por dentro de toda palavra da língua que me colonizaram, capturando com inteligência as vazões, os propósitos e planos. Pesquiso o vocabulário com a curiosidade de um leigo, revogo essa língua. Me sinto um inventor, onde a obsessão é pela analogia, como um cientista que acredita que compartilhamos o mesmo átomos das coisas. Analogia como um ferro de solda, como uma superexposição de um esqueleto, e desses ossos refaço toda a anatomia. A composição é uma invenção.

“F3SGA”, 2022. Mixed on canvas.

O que você mais gosta de fazer quando não está trabalhando?

Ouvir e dançar músicas.

Qual o principal tema que atravessa suas obras?

Emancipação.

Como conheceu a HOA?

Então, em 2018 faço minha primeira viagem até São Paulo, onde conheço na cidade não só outros os artistas representados mas também criadores da galeria, dois anos depois recebo a ligação de Igi me convidando a fazer parte dos representados de uma galeria que acabara de nascer.

Na sua visão, qual o papel do artista hoje em dia?

Hm. Não sei, muito pessoal, para mim é discutir novos imaginários entre e para minha comunidade.

Qual o seu maior sonho(s)?

Ver a família sanguínea e a escolhida bem e feliz

“JAY 5000”, from the series “Shiny”, 2022.

Conheça mais sobre o trabalho de M0XC4:

teia.art/m0xc4

artsy.net/partner/hoa/artists/m0xc4